O título deste blog parece estranho e contraditório, mais ao longo deste artigo, seguramente todos entenderão.
Começamos essa viagem lembrando de que somos a última geração de seres humanos que tiveram a oportunidade de conhecer o mundo sem a tecnologia, um mundo onde o conhecimento e as habilidades eram o diferencial de uma pessoa.
As gerações dos anos 60, 70 viveram um outro mundo e muitos conseguiram se adaptar a essa nova era, o que não foi fácil.
Em nossa profissão o termo “luthieria” derivado em sua raiz da palavra LUTHIER ou CONSTRUTOR, “inclusive já falei sobre este assunto em outro blog”, hoje é usado para descrever uma oficina de REPARAÇÃO de instrumentos de sopro.
LUTHIERIA DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, isto soa bonito para as novas gerações, mas para os mais “antigos” que viveram a realidade de criar e construir com as próprias mãos, parece mais alguém usurpando o mérito dos verdadeiros construtores.
Em meados de 2010, em muitos países incluindo o Brasil, iniciou uma explosão de interessados em reparar instrumentos musicais, o crescimento de bandas e orquestras e a falta de profissionais no ramo da reparação naquele momento chamou a atenção de muita gente.
Com isto, as novas gerações buscam conectar-se ao velho mundo através deste ofício e ao mesmo tempo preparar-se para o futuro migrando para o mundo da reparação de instrumentos de sopro onde o que era exclusividade de poucos no passado, agora é o anseio de muitos.
Tenho viajado muito pelo mundo e dado muitos cursos em diferentes países, estando com pessoas da “velha guarda” e das novas gerações e tenho uma opinião muito bem formada sobre o assunto. Mas, antes de dar minha opinião, devemos inicialmente fazer uma reflexão de mercado:
“No passado os instrumentos musicais eram construídos para durar muito tempo, digo isto porque como sou técnico restaurador, já passaram por minhas mãos vários instrumentos antigos. Ainda conservo uma tuba americana dos anos 40, um Ophicleide de 1820 além de outras joias e são indestrutíveis se é que posso dizer algo sobre eles.
Neste tempo, por serem tão duráveis, davam pouca manutenção e por isto haviam mais construtores que reparadores, porém o mercado mudou e hoje os instrumentos são fabricados cada vez mais sensíveis e de vida curta, com materiais mais baratos a um preço de mercado que sequer, vale a pena reparar alguns destes instrumentos.
Nesta direção, hoje existem muito mais reparadores que construtores de instrumentos de sopro e creio que muito em breve, com a alta tecnologia e os novos materiais, serão construídos instrumentos cada vez mais baratos e com melhor qualidade para o músico normal e corrente, o que diminuirá a necessidade de reparação.
Já tenho conhecimento, inclusive, de projetos inovadores de instrumentos que serão construídos por impressoras 3D, por exemplo.
Por outro lado, devemos lembrar que, as novas gerações estão perdendo o interesse pela música clássica, orquestras e bandas, desaparecendo governos que investem cada vez menos em educação e música clássica, o que encolhe também este mercado.”
Juntamos estas análises e teremos um seguimento baixando custos de produção e diminuindo a quantidade de usuários, somado a um crescente aumento de pessoas interessadas em serem reparadores de instrumentos de sopro.
Se tivermos um olhar mais crítico podemos dizer que a área de reparação de instrumentos de sopro não tem um bom futuro, podemos citar, como exemplo, os relojoeiros, ao se popularizarem os relógios, houve a mesma expansão do mercado profissional, porém, hoje em dia encontrar um bom relojoeiro é quase impossível, podemos achar os trocadores de peças e que dirão que é melhor comprar um novo que reparar o relógio antigo.
Os bons relojoeiros não trabalham com qualquer produto e tem uma clientela fiel e que paga o preço que vale o trabalho deste excelente profissional.
Na nossa área técnica, podemos sentir a transformação principalmente porque os mais antigos, já sabendo desta tendência, passaram a “vender informação” em forma de cursos, digo vender informação porque existe uma diferença brutal entre informação e formação, não gosto de tocar muito neste assunto, mais existem muitos “cursos” sendo oferecidos, que não formam bons profissionais e que simplesmente fazem com que os reparadores antigos mudem de ofício deixando de reparar para “ensinar”, porém os cursos não possuem metodologia, métricas de desenvolvimento e profissionalização dos alunos o que é muito triste.
Vendo este quadro, isto talvez seja desanimador para muitos e de verdade deve ser, porém, há uma luz no fim do túnel, eu chamo esta luz de trabalho de excelência!
Já na década dos anos 90 eu acompanhava o trabalho de um grande palestrante chamado ALFREDO ROCHA, (indico que escutem seus vídeos) e ele dizia que quem estava contente com seu trabalho naquela época, deveria correr o dobro para se manter no mercado e quem quisesse pensar no futuro, deveria correr 10 vezes mais.
Também Alfredo Rocha sempre insiste em falar de QUALIDADE TOTAL e desde de então, tenho isto como missão principal em minhas ações e daí vem a boa notícia.
Como em todas as profissões, há bons e maus profissionais, dedicados e aventureiros, honestos e desonestos e em nossa profissão não seria diferente, porém existe, uma seleção natural do mercado onde SOMENTE OS MELHORES SOBREVIVEM.
Post de Instagram, fotos montadas e vídeos bonitos servem para ganhar seguidores, mais não funcionam para uma clientela exigente e especializada, porque ainda que o mercado musical sofra todas estas mutações que eu citei anteriormente, devemos lembrar que os músicos profissionais seguirão existindo e seus instrumentos profissionais e caros também, é aí entra o bom profissional.
Quem se dedicar a aprender corretamente com boa base de conhecimento e dedicação, poderão com muito trabalho e esforço se transformar em uma referência para o futuro, mais infelizmente os demais ficarão pelo caminho.
Por isto, indico sempre que o músico pesquise muito antes de mandar seu instrumento a um técnico ainda mais quando ele se intitula “Luthier” e ao mesmo tempo ensino aos meus alunos buscarem a excelência, pois se não for assim, não seguirá sendo meu aluno.
Medir resultados e comprometer-se com o desenvolvimento do aluno é uma obrigação do professor e deve ser uma missão.
Me lembro das palavras do meu professor na academia no Japão “Araken-san, se você se transformar em um grande técnico, minha missão de vida está cumprida e já posso ir em paz”, sendo assim, não posso fazer menos que o meu melhor e ensinar com a mesma paixão e dedicação de Saito-san.
Por isto, se alguém deseja entrar ou seguir nesta profissão, deverá trabalhar duro e com o mais alto padrão de qualidade, investindo em uma formação de alto nível e uma dedicação total.
Somente posso finalizar este post dizendo que com amor, paixão e dedicação à profissão de reparador ou restaurador vale cada esforço feito e que podemos desfrutar de todo o caminho sabendo que existirá um
futuro certo e seguro.
Um forte abraço a todos!
Yorumlar